25/04/2014 às 00h00 com informações de Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região

Trabalhadora enquadrada como portadora de deficiência apenas para preenchimento da quota legal será indenizada

Depois de avaliação médica empregada foi considerada portadora de nanismo por ter apenas 1,43m de altura

Com a proposta de estimular a inclusão social de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, uma grande empresa do ramo de alimentos lançou um projeto em parceria com uma empresa de inclusão e responsabilidade social. O objetivo do programa era encontrar candidatos para preencher a quota legal de contratação de pessoas com deficiência imposta por lei. Mas qual não foi a surpresa de uma empregada ao descobrir que havia sido incluída nessa quota, mesmo sem ser portadora de qualquer deficiência. Diante do constrangimento causado pela situação, ela procurou a Justiça do Trabalho e conseguiu obter a condenação da ex-empregadora ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 50 mil. E a decisão foi mantida pela Turma Recursal de Juiz de Fora, com base no voto do juiz convocado José Nilton Ferreira Pandelot.

Ficou demonstrado no processo que a reclamante foi contratada em 23/03/09, para exercer a função de auxiliar operacional. Em julho de 2011, foi convocada para uma avaliação médica, quando assinou um documento que atestava sua condição de deficiente física. Ela foi considerada portadora de nanismo por ter apenas 1,43m de altura. Depois disso, teve uma foto divulgada em uma palestra realizada para os empregados da empresa, onde foi identificada como uma das portadoras de deficiência física contratadas pela empresa. A partir de então, passou a sofrer diversos tipos de constrangimento.

Conforme observou o relator, uma testemunha confirmou a existência de brincadeiras na empresa envolvendo a reclamante. Segundo o relato, havia chacota na fila de refeição, quando falavam que a preferência era dela em razão de sua condição de deficiente. Além disso, a testemunha ouviu, no posto de saúde da cidade, que a colega estava fazendo tratamento em razão de bullying. Ela própria, aliás, chegou a se encontrar com a reclamante em um consultório psiquiátrico. E afirmou que não considera a reclamante anã. Os comentários e brincadeiras sobre o nanismo da reclamante eram feitos ônibus da empresa e na cidade, quando a turma se reunia. De acordo com outra testemunha, a reação da reclamante diante disso era sempre a mesma: abaixava a cabeça e saía do local.

"A reclamada utilizou-se de uma pessoa não portadora de deficiência para preencher os quadros da empresa com a cota reservada às pessoas enquadradas como portadoras de deficiência" concluiu o julgador, diante do conjunto de provas do processo. Ele confirmou os fundamentos da sentença, que considerou que a reclamante foi taxada de anã pela ré de forma unilateral, sem qualquer respaldo técnico para tanto. A juíza de 1º Grau registrou, inclusive, que uma fotografia de corpo inteiro da reclamante deixava claro a qualquer pessoa leiga não se tratar de portadora de nanismo, mas apenas de pessoa de baixa estatura. Outro aspecto abordado foi o da avaliação médica. Além de ter sido realizada dois anos e três meses após a admissão, o médico considerou como "limitações funcionais corporais" aquelas "relacionadas a baixa estatura". No entanto, não apontou quais seriam essas limitações na reclamante.

"Verifica-se a situação constrangedora a que foi exposta a autora. Afinal, violam direitos de imagem e de intimidade a qualificação unilateral e indevida do trabalhador como pessoa com necessidade especial, absorvida que foi pelo programa de captação de pessoas portadoras de deficiência, e a divulgação não autorizada de sua fotografia para fins de publicidade institucional", registrou o relator, reconhecendo a violação dos direitos da personalidade no caso. Ele lembrou que o princípio da dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil, na forma do artigo 1º, inciso III, da Constituição da República.

Nesse contexto, a Turma de julgadores decidiu manter a condenação ao pagamento de indenização por dano moral, conforme previsto no artigo 5º, inciso X, da Constituição. O valor de R$50 mil foi considerado razoável, tendo em vista os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além do caráter reparatório e pedagógico da indenização. O relator chamou a atenção para a grande repercussão do episódio na localidade, em nível extra-empresarial, bem como para o caráter paradigmático do caso e sua gravidade.