09/05/2017 às 00h00 com informações de jota

ICMS pode ser aproveitado mesmo com fornecedor inidôneo

Depois de perder no TIT, empresa obtém liminar no TJ-SP

Créditos de ICMS podem ser aproveitados por empresa que recebe nota fiscal declarada inidônea, mas desde que fique demonstrada a boa-fé do contribuinte. A decisão foi proferida em abril pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), contrariando pronunciamento do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT), que analisa questionamentos de contribuintes contra cobranças da Receita do Estado de SP.

A decisão do desembargador José Roberto de Souza Meirelles, da 12º Câmara do TJ-SP (Processo 2057360-63.2017.8.24.0000) foi baseada na Súmula 509, editada em 2014 pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo a qual é lícito ao comerciante de boa-fé aproveitar os créditos de ICMS decorrentes de nota fiscal posteriormente declarada inidônea, quando demonstrada a veracidade da compra e venda.

No caso analisado, a empresa Biocapital havia declarado ao Fisco o aproveitamento de créditos de ICMS provenientes de notas fiscais declaradas inidôneas, emitidas pela fornecedora Nova Indústria e Comércio Ltda, e por isso, foi autuada e multada pelo Fisco paulista.

A Biocapital questionou administrativamente a cobrança, mas não teve sucesso no Tribunal de Impostos e Taxas. O resultado foi proferido por voto de desempate do presidente da Câmara, que votou pela não concessão do crédito de ICMS (Processo nº 4046179). A empresa, então, recorreu ao Judiciário, ajuizando uma ação anulatória com pedido de tutela provisória.

Divergência

A jurisprudência favorável do STJ em relação ao contribuinte de boa-fé não foi suficiente para resolver a questão no TIT.  Mesmo que a empresa apresente provas de boa-fé, existem muitos casos em que a cobrança é mantida porque os julgadores não aceitam as provas ou as julgam insuficientes.

Foi o que aconteceu com a Biocapital. A empresa apresentou uma série de documentos para comprovar a legalidade das transações comerciais: cópias de DANFE de devolução e de saídas de mercadoria emitidas pela empresa autuada e pela fornecedora, cópias de documentos internos referente a pesagem de veículos de transporte e outras informações, cópias de três boletos bancários, cópias de demonstrativo de pagamento, transferência bancária e e-mails, e cópias de documentos intitulados “ Cessão de Transferência de Crédito”. Ainda assim, não conseguiu comprovar sua “inocência” perante o tribunal administrativo.

Os juízes que julgaram o caso de forma desfavorável ao contribuinte afirmam que a empresa não conseguiu explicar que adquiriu as mercadorias de forma legítima da empresa fornecedora e que, é sim, dever dela tomar os devidos cuidados e precauções no sentido de verificar a regularidade do fornecedor perante o Fisco e também de exigir o documento fiscal hábil, de acordo com o que dispõe o artigo 22-A da Lei 6.374/89 do RICMS/00.

Embora possa parecer que o TIT vem ignorando a jurisprudência do STJ, a realidade é que a divergência é um fator interno do tribunal administrativo.

“Não é exatamente que o TIT diverge do STJ. O que acontece é que mesmo que o contribuinte apresente várias provas, elas nunca são consideradas o suficiente para comprovar a boa-fé, pois os juízes discordam sobre qual seria a prova necessária para a legitimação do negócio”,  explica a advogada Amal Nasrallah, do escritório Nasrallah Advocacia.

Por vezes, diz a tributarista, os juízes do TIT se apegam “a detalhes” para desconstituir da prova. “A grande maioria das decisões são contra o contribuinte, mas como depende de prova é preciso analisar no caso a caso. Tanto existem casos que são exageros do tribunal administrativo, como casos também que o contribuinte não faz uma prova razoável” afirma.

De acordo com Helena Vicentini, coordenadora do contencioso tributário do escritório Molina Advogados, que representou a Biocapital no processo, “os contribuintes geralmente não conseguem o aproveitamento do ICMS, precisando recorrer ao judiciário e demonstrar novamente todos os documentos probatórios para evitar o depósito judicial, sendo extremamente difícil o cancelamento dessas autuações nos tribunais ” afirma.

A ação anulatória e a tutela provisória

A empresa autuada ajuizou ação anulatória com pedido de tutela provisória de evidência com fundamento no art. 112 do Código Tributário Nacional (CTN). Pelo dispositivo, em caso de dúvida em relação à legalidade do fato ou às suas circunstâncias materiais e efeitos, deve-se interpretar a norma de maneira mais favorável ao contribuinte.

A liminar foi indeferida na primeira instância. No tribunal, porém, o relator concedeu a antecipação dos efeitos da tutela, por entender que as operações ocorreram antes da declaração de inidoneidade da empresa vendedora, o que demonstrou aparente boa-fé. Para o magistrado, isso justificaria a suspensão da exigibilidade do crédito, que não acarretava nenhum dano imediato ao Fisco.

“Quando a empresa prova que as operações de circulação de mercadorias ocorreram e que houve pagamento regular do preço não há que se falar na glosa dos créditos de ICMS no adquirente das mercadorias. Assim o precedente está em linha com a jurisprudência sobre o tema” afirma o advogado Júlio Maria de Oliveira, sócio do escritório Machado Associados.

Uma novidade é o fato da tutela de evidência ter sido concedida no agravo de instrumento interposto. A liminar, concedida sob a vigência do novo Código de Processo Civil, faz com que o crédito fique suspenso sem depósito judicial, impedindo a Fazenda Estadual de prosseguir com qualquer meio de cobrança contra à empresa.

Os prejuízos da inidoneidade ao contribuinte

A declaração de inidoneidade fiscal é uma forma das Fazendas Estaduais evitarem que o contribuinte do ICMS em situação irregular emita notas fiscais, consideradas inidôneas por algum motivo. Mas, existem situações em que o contribuinte adquire uma mercadoria e, posteriormente a operação, o fornecedor é declarado inidôneo. Essa declaração é retroativa e pode macular as operações comerciais do fornecedor. Isso porque a partir da data em que ocorreu a infração, todos os negócios realizados serão considerados ilícitos, atingindo os que comercializaram com ele.

Aquele que negocia com o contribuinte faltoso responde por ter agido de má-fé ou por não ter sido diligente. Com a inidoneidade, o contribuinte adquirente ou tomador dos serviços poderá ser impedido de exercer atividades empresariais e responder criminalmente pelos atos daquele que emitiu a nota fiscal inidônea.

Para provar que a negociação ocorreu antes da declaração da inidoneidade, o contribuinte pode comprovar a legalidade da aquisição a partir de documentos como comprovantes de pagamento, notas fiscais da operação, SINTEGRA da época, controle de estoque, registro do livro de entrada e declaração de cadastro do contribuinte do ICMS (antiga DECA).