26/06/2017 às 00h00 com informações de Valor

Alteração no ISS deverá ser levada ao Judiciário

Hermano Barbosa: deveria haver uma ampla discussão com o mercado afetado e um prazo para adaptação

Administradoras e gestoras de fundos de investimentos e administradoras de cartões de crédito e débito já preparam ações judiciais contra recente alteração na forma de pagamento do Imposto sobre Serviços (ISS). Por lei, publicada no dia 1º, devem recolher o tributo no local de domicílio do tomador do serviço. Até então, valia o município do estabelecimento prestador.

Para os contribuintes, a mudança, além da dificuldade logística, poderá gerar insegurança e impacto financeiro devido às diferenças de alíquotas entre os municípios. Como o recolhimento é mensal, as empresas estariam sujeitas à nova forma de tributação a partir de julho.

No caso de fundo de investimento, o tributo terá que ser recolhido no domicílio do administrador (tomador de serviços), e não mais onde está localizado o gestor – que negocia e contrata, em nome do fundo, os ativos financeiros e os intermediários para realizar operações. Se o gestor está no Rio de Janeiro e o administrador em São Paulo, por exemplo, o imposto passará a ser quitado na capital paulista.

A situação fica ainda mais complexa para as administradoras de cartão. Pela norma, deve-se recolher o tributo onde estão os terminais eletrônicos ou as máquinas das operações efetivadas, que deverão ser registradas no local do domicílio do tomador do serviço. Ou seja, o tributo terá que ser recolhido em municípios de todo o país.

As mudanças estão na Lei Complementar nº 157 que incluiu o inciso XXIV no parágrafo 4º do artigo 3º da Lei Complementar nº 116, que trata do ISS. No dia 1º deste mês, o presidente Michel Temer publicou o dispositivo que ele mesmo tinha vetado anteriormente. O veto foi derrubado pelo Congresso Nacional.

O presidente havia vetado sob a justificativa de que a alteração significaria uma potencial perda de eficiência e de arrecadação tributária, "além de redundar em aumento de custos para empresas do setor, que seriam repassados ao custo final, onerando os tomadores dos serviços". Porém, como o veto foi derrubado, o presidente resolveu sancionar a lei da forma como voltou do Congresso.

"Da noite para o dia a regra mudou. Para uma alteração como essa, que teve uma tramitação tumultuada, deveria haver uma ampla discussão com o mercado afetado e um prazo para adaptação", diz o advogado Hermano Barbosa, sócio da área tributária do escritório Barbosa, Müssnich, Aragão (BMA).

Diante da situação, administradoras e gestoras de fundos de investimentos já preparam uma estratégia judicial para discutir o tema. Algumas gestoras localizadas no Rio de Janeiro, por exemplo, pensam em ajuizar ação no próprio município para afirmar que deixarão de recolher o imposto, conforme a alteração na Lei Complementar 116. Assim, depositariam os valores judicialmente até que o Judiciário defina a questão.

Outros contribuintes cogitam entrar com ações de consignação em pagamento para que haja a definição judicial sobre qual municipio deve receber o Imposto sobre Serviços.

A alteração só poderá valer na prática quando for regulamentada pelos municípios, na opinião do advogado Nycolas Colucci, do escritório Chulam Colucci Advogados. Até as publicações, a recomendação é a de que se continue recolhendo o ISS no local de domicílio do prestador de serviços.

Para o advogado Diego Aubin Miguita, do Vaz, Barreto Shingaki & Oioli Advogados, as administradoras de fundos ainda não digeriram bem a derrubada do veto e não conseguiram mensurar o impacto e custos adicionais que possa gerar.

De acordo com ele, ainda há margem para uma dúvida: se o tomador de serviços a ser considerado seria a administradora ou o investidor do fundo, o que tornaria essa tributação ainda mais complicada. Para ele, é importante agora aguardar a regulamentação pelos municípios.

A nova legislação, porém, trouxe um novo argumento para que o ISS deixe de incidir na gestão de fundos estrangeiros (offshore). Como a tomadora de serviços fica no exterior, a gestora ficaria liberada de recolher o imposto, segundo Barbosa.

A discussão, segundo ele, é antiga na Justiça e há decisões isentando gestores de fundos estrangeiros do recolhimento do ISS por se tratar de exportação de serviços. "A nova lei trouxe uma discussão nova, aplicável apenas de junho em diante", diz. Para Miguita, "a nova legislação traz mais força para que não haja pagamento nesses casos".

Procurada pelo Valor, a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) informou, por meio de sua assessoria, que ainda está avaliando a alteração.