MP da Liberdade Econômica pode gerar insegurança jurídica
A Medida Provisória (MP) da Liberdade Econômica é importante para facilitar o ambiente de negócios no Brasil, mas terá que ser mais debatida e detalhada pelo Congresso Nacional para que se evite uma série de inseguranças jurídicas, avaliam especialistas.
A MP foi enviada pelo governo federal ao Congresso na última terça-feira (30). Esta permitirá que pessoas físicas ou jurídicas desenvolvam negócios de baixo risco, sem a necessidade de qualquer ato de liberação por parte da administração pública, como licenças, autorizações, inscrições, registros, alvarás, etc.
“A medida é muito positiva já que, afinal, ela busca simplificar uma série de burocracias que acabam impedindo a facilitação de negócios no Brasil”, afirma o sócio da área tributária do Demarest Advogados, Douglas Mota. Contudo, um dos pontos chamou a atenção dele é que a MP não deixa claro como serão editadas as súmulas vinculantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
As súmulas são uma interpretação pacífica ou majoritária adotada por um Tribunal a respeito de um tema específico. Mota explica que, atualmente, a edição das súmulas conta com a participação de contribuintes, que podem ser representados na figura de confederações de categorias econômicas, como da indústria, comércio, etc.
No entanto, a MP não menciona a participação desses grupos, o que é preocupante, tendo em vista que as súmulas podem acabar sendo mais favoráveis à Receita Federal, podendo prejudicar empresas e consumidores. “Este ponto precisa ser mais esclarecido”, reforça Mota.
Já o professor de Direito Civil do Ibmec-RJ, João Quinelato, vê um certo risco no fato da medida prever liberdade nos pactos de contratos empresariais, inclusive sobre normas de ordem pública. “Estas não poderão ser alteradas judicialmente se tiverem sido livremente pactuados entre as partes”, destaca a MP. Na avaliação de Quinelato, a ausência de uma participação mínima do Estado pode ter impactos sociais e econômicos significativos.
Ele exemplifica que este ponto da medida provisória pode interferir, por exemplo, nos princípios do artigo 421 do Código Civil, como a “função social dos contratos”.
Este princípio prevê que todos os contratos empresariais precisam se preocupar com os reflexos sociais que os seus negócios geram, de forma a evitar, por exemplo, fraudes, propaganda enganosa, concorrência desleal, entre outros.
Quinelato ilustra, por exemplo, que, diante de uma situação na qual uma empresa viola o Código de Defesa do Consumidor, o que valerá? A legislação que sairá da MP ou o próprio Código? Para o professor do Ibmec-RJ, esses pontos também não estão claros.
Minimizar crise
Quinelato pondera que a MP vem em um bom momento, pois a simplificação do ambiente de negócios pode ajudar a minimizar um pouco o cenário negativo de elevada taxa de desemprego e fraca atividade econômica. “O problema foi a via eleita para inserir essas mudanças. Ao invés de MP, as alterações deveriam ter sido propostas por meio de uma legislação ordinária para ser mais discutida pelo legislativo”, critica Quinelato.
“Se a MP caducar, por exemplo, o que acontecerá com o empresário que abriu uma sociedade limitada, sendo o único sócio, durante o período em que a medida vigorou? Ele terá que fechar a empresa?”, questiona o professor.
Pela MP da Liberdade Econômica, a sociedade limitada poderá ser formada por apenas um sócio, não precisando se socorrer mais a uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada que requeria capital mínimo.
A professora de economia do Insper, Juliana Inhasz, destaca ainda que a medida não especifica o que seriam negócios de baixo risco ambiental, sanitário e social. Para Inhasz, restam dúvidas sobre como e quais órgãos definirão o que é uma atividade de baixo risco.
Segundo a professora, o Brasil ainda não tem um forte cumprimento de regras ambientais e nem uma correlação de forças equilibrada no mercado de trabalho, que permita “deixar vago” o que é ou não é uma atividade de baixo risco.
Por outro lado, o presidente do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial (Ibrademp), Daniel Kalansky, avalia que a MP traz segurança jurídica para os investidores e impactos positivos para o mercado de capitais. “Os fundos de investimentos poderão estabelecer, em seus regulamentos, que a responsabilidade de cada investidor é limitada ao valor de suas cotas. Antigamente, o investidor respondia por eventual patrimônio negativo do fundo”, observa Kalansky.