Empresas querem restabelecer acordos para suspensão e redução de salários
Em busca de maior agilidade nos acordos com trabalhadores, entidades empresariais estudam pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão da liminar que instituiu necessidade de aval prévio de sindicatos em negociações individuais de redução de jornada e salário ou suspensão de contrato. Os sindicatos, por sua vez, tentam sair na frente e costuram acordos “guarda-chuva”, uma espécie de aval antecipado a negociações diretas entre empresas e empregados, com garantias mínimas que vão além das previstas na medida do governo.
As próprias entidades que representam os trabalhadores veem risco de a decisão judicial ser derrubada a pedido dos empresários ou do governo. Por isso, a tentativa é estabelecer salvaguardas mínimas para os empregados e, ao mesmo tempo, dar agilidade às negociações.
A equipe econômica criou um programa que permite a negociação individual entre empresas e trabalhadores, sem mediação das entidades de classe, para redução de jornada e salário em até 70% por até três meses ou suspensão do contrato por até dois meses. Em compensação, o governo paga um benefício equivalente a até 100% do seguro-desemprego a que o trabalhador teria direito em caso de demissão. Os sindicatos precisam ser avisados em até 10 dias para coibir eventuais abusos, mas até lá a empresa e o trabalhador já podem pôr o acordo em prática.
Uma ação da Rede Sustentabilidade questionou a validade do programa. O ministro do STF Ricardo Lewandowski decidiu, de forma monocrática, que os acordos individuais só terão validade após manifestação dos sindicatos, uma etapa que pode levar até oito dias. Sem o ingresso de receitas para abastecer o caixa e pagar salários, o empresariado foi ao desespero com a decisão e alertou o governo do risco de demissões em massa.
Como mostrou o Estadão/Broadcast, a Advocacia-Geral da União (AGU) cogita ingressar com um pedido de suspensão de liminar, um tipo de processo que vai direto ao presidente da Corte, ministro Dias Toffoli. Na prática, ele teria o poder de, numa canetada, anular a decisão de Lewandowski. A medida, porém, está sendo avaliada com cautela porque geraria intenso desgaste entre os ministros.
O julgamento está previsto para 16 de abril, mas o pedido de suspensão de liminar poderia ser analisado antes. Caso a AGU não adote essa estratégia, a Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) avalia ingressar com a ação. O presidente da CNDL, José César da Costa, diz que a medida do governo trouxe “fôlego e tranquilidade” a um setor que perde R$ 7 bilhões ao dia com o fechamento de 60% dos estabelecimentos devido à quarentena. “A liminar nos deixa numa situação difícil. Não é só uma crise. É uma guerra, e numa guerra nós precisamos de exceções”, argumenta.
Costa diz que a decisão de Lewandowski cria dificuldades, aumenta o custo e ainda coloca empresas e trabalhadores nas mãos dos sindicatos, que poderiam cobrar valores em troca da análise mais célere do acordo. Sem a agilidade original do programa, o presidente da CNDL diz que há risco de maior número de demissões, embora a entidade não tenha estimativas de quantas.
O empresário Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan e apoiador do governo Jair Bolsonaro, afirma que negociou a suspensão do contrato de quase 10 mil funcionários (praticamente metade do quadro), em função do fechamento de lojas. Ele argumenta que a medida é positiva ao preservar o emprego e, ao mesmo tempo, ajudar no isolamento social. “Eu espero que ela (liminar) seja revogada. Se permanecer o entendimento, vai ser um caos”, diz.
“Quando o empregador não vê a luz no fim do túnel, a decisão é a demissão”, afirma Hang. Segundo ele, a reversão da decisão de Lewandowski é a luz no fim do túnel neste caso. Se a liminar persistir por mais uma semana, no entanto, “a demissão em massa vai ser instantânea”, prevê o empresário. “A Havan está ciente, porque já fez os contratos com todos esses 10 mil, que até semana que vem resolva. Se não, nós vamos ter que ver a segunda opção. Mas eu espero que não vai ter a segunda opção. Tenho a certeza de que o bom senso irá prevalecer”, diz.
‘Guarda-chuva’
O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, diz que a central tem articulado acordos “guarda-chuva” entre sindicatos patronais e de empregados para fixar parâmetros gerais de negociação. A ideia é prever em convenções coletivas quais instrumentos poderão ser usados: redução de jornada e salário (em quais porcentuais) e/ou suspensão do contrato.
Por outro lado, os sindicatos dos trabalhadores acordam nessa “validação prévia” algumas vantagens, como continuidade do pagamento do vale refeição e necessidade de homologação pelo sindicato das demissões durante a crise.
A partir desse acordo mais amplo, as empresas podem definir o uso dos instrumentos que melhor se adequarem à sua realidade. Por exemplo, uma rede varejista pode negociar a suspensão de contratos de funcionários de uma unidade que esteja fechada, mas sem mexer na jornada daqueles que atuam em uma unidade aberta e com alta demanda. Ou pode combinar os instrumentos, suspensão para um grupo de trabalhadores, redução de jornada para outro, caso ambos estejam previstos na convenção.
Segundo Patah, cerca de dez acordos “guarda-chuva” estão sendo negociados. Um deles abrange o setor de supermercados em São Paulo. “Tem mercadinho que precisou fechar, mas tem supermercado que está com alta demanda”, conta. “Independentemente da decisão de Lewandowski, esse acordo será garantido, porque a lei diz que o negociado vale sobre o legislado. E a liminar pode cair”, afirma o presidente da UGT.