18/09/2015 às 00h00 com informações de DCI

Execuções fiscais empacadas levam Judiciário a 100 milhões de processos

São 27 milhões de execuções pendentes de julgamento e com poucas perspectivas de serem resolvidas

As ações judiciais de cobrança de impostos - as execuções fiscais - são o tipo de processo que mais abarrotam o Judiciário brasileiro, colaborando para a soma de quase 100 milhões de processos, conforme levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

São 27 milhões de execuções pendentes de julgamento e com poucas perspectivas de serem resolvidas, segundo o relatório Justiça em Números. Só no ano passado, esse estoque de execuções cresceu em 700 mil. Apenas 2,7 milhões das 3,4 milhões de ações ajuizadas foram resolvidas. Junto com um grande número de causas trabalhistas e de direito do consumidor, as execuções fiscais têm feito o Judiciário fechar o ano sempre com mais ações do que começou. O número pulou de 59,1 milhões de casos pendentes no começo de 2009 para 70,8 milhões no início de 2014.

Somando esse estoque de casos pendentes com as 28,9 milhões ações que entraram durante o ano, chega-se a 99,7 milhões de processos em tramitação em 2014. O CNJ, que dedica uma seção do relatório ao impacto das execuções fiscais, destaca que essas cobranças de imposto "são os grandes responsáveis pela morosidade dos processos de execução [como um todo]".

O sócio do Souto, Correa, Cesa, Lummertz & Amaral Advogados, Guilherme Amaral, comenta que o grande problema das execuções é a ausência de patrimônio do contribuinte. Ele também destaca que em muitos casos a legislação protege o patrimônio dos devedores. Com isso, os processos não têm como avançar. "É um problema alheio ao Judiciário e que lamentavelmente tende a se agravar com crise econômica", destaca o advogado.

Considerando todo o acervo de execuções (fase de cumprimento de sentença), o estudo mostra que 75% dos casos pendentes envolvem a cobrança de impostos. O restante envolve a execução de sentenças variadas, como as de casos criminais ou de outros tipos.

Pendências

O CNJ também fez uma simulação de qual seria o impacto de retirar as execuções fiscais do Judiciário. Sem as cobranças de imposto, a Justiça atenderia 101,1% da demanda de processos anual. Ou seja, conseguiria resolver 100% dos processos que entram e ainda liquidar uma pequena parcela do estoque.

Hoje, contando as execuções fiscais, o Judiciário atende cerca de 98,7% do número de ações que são ajuizadas todo o ano. A parcela restante fica pendente de julgamento e passa a integrar o estoque de casos pendentes de decisão.

Ainda neste tipo de comparação, o relatório do CNJ traz que o Judiciário atendeu, nos últimos cinco anos, entre 74% e 80% da demanda de execuções fiscais, acumulando o restante dos casos ano a ano.

Segundo Amaral, não há perspectiva de solução para o problema das execuções. Autor de um livro sobre o novo Código de Processo Civil (CPC), ele conta que nem a renovação das normas processuais, que entram em vigor em março de 2016, deve resolver o congestionamento das execuções.

"É um problema externo [ao Judiciário]. Com a crise, vai aumentar ainda mais o número de execuções infrutíferas. Se o executado não tem patrimônio, o processo não acaba", diz.

Demissões

Entre os 28,9 milhões de processos que entraram no Judiciário em 2014, o assunto mais recorrente foi o término de contrato de trabalho, tema que abrange pedidos como os de horas extra e adicionais de insalubridade ou periculosidade. Foram 5,3 milhões de ações sobre verbas rescisórias.

Em segundo lugar, com 2,8 milhões de processos vieram as causas relacionadas a obrigações e contratos, do Direito Civil. Os próximos assuntos mais frequentes foram as causa envolvendo direitos de consumidores (2 milhões) e direito tributário (1,6 milhão).

Segundo Amaral, o novo CPC deve contribuir especialmente na resolução dos casos de direito do consumidor, que envolvem assuntos repetitivos. Também em discussões sobre a constitucionalidade de tributos é possível que o código processual acelere os julgamentos. "Nas ações trabalhistas, não vejo perspectiva de melhora. Pelo contrário, a crise tende a aumentar os litígios."

Custo

Para manter o Judiciário, o estudo afirma que são gastos por ano R$ 68,4 bilhões - o equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) ou R$ 337 por brasileiro. A maior parte das despesas é da Justiça Estadual (R$ 37,6 bilhões). Em seguida, vêm a Justiça do Trabalho (R$ 14,2 bilhões) e a Justiça Federal (R$ 8,7 bilhões).

Os gastos com salários constituem a maior parte desses valores, chegando a 89,5% do orçamento total. Ao todo, existem 16.927 magistrados (incluindo juízes, ministros e desembargadores), 279 mil servidores e 139 mil funcionários auxiliares. Fora as despesas com recursos humanos, a Justiça gasta R$ 7,2 bilhões. Desse montante, R$ 1,8 bilhão (25%) é gasto em informática.

Mesmo assim, a implementação do processo eletrônico segue devagar. Por enquanto, abrange pouco menos da metade (44,7%) dos casos novos, um universo de 11,8 milhões de processos. Nesse sentido, os tribunais estaduais tem a pior média de novos casos eletrônicos: 35,2% das novas ações são feitas já em meio digital.

A Justiça também contribui com uma arrecadação de R$ 26,9 bilhões, entre taxas processuais e valores decorrentes de execuções fiscais. Mas subtraindo as despesas de R$ 68,4 bilhões, o Judiciário fica com um déficit de R$ 41,5 bilhões. Segundo Amaral, apesar do custo da Justiça vir crescendo, o sistema caminha para o colapso. "É preciso de uma profunda mudança cultural."