13/11/2015 às 00h00 com informações de Valor Econômico

Pequenas ainda têm um longo caminho a percorrer

Analistas acreditam que ainda há muito chão pela frente antes que seus efeitos sejam sentidos

Embora tenha ganhado o apelido de Lei Anticorrupção, a Lei 12.846 não tem poder para coibir todas as manifestações de corrupção que existem, porque é limitada a estabelecer punições do ponto de vista administrativo das empresas. E, mesmo dentro desse escopo, alguns analistas acreditam que ainda há muito chão pela frente antes que seus efeitos sejam sentidos de forma contundente. 

Expressões como governança corporativa, compliance e canais de denúncia podem ser comuns no universo das grandes empresas brasileiras e multinacionais. Mas quando se trata das pequenas e médias, percebe-se que ainda há um grande trabalho de mudança de cultura a ser realizado. Ex-presidente da Câmara Americana de Comércio e sócio da empresa de recrutamento Caldwell Partners, Arthur Vasconcellos também faz parte do conselho de administração de empresas de médio porte. "Em minha experiência no contato com pequenas e médias empresas, noto que algumas não têm a mínima ideia do que a lei representa. Muitas não estão fazendo nada para se adaptar e há algumas que até desconhecem sua existência", afirma. 

Apesar disso, Vasconcellos considera a publicação da Lei 12.846 um avanço e acredita que ela vai começar a ser mais difundida e a "pegar", na medida em que as consequências de seu não cumprimento ganhar destaque. "Quando a lei de usar cinto de segurança surgiu, ninguém achava que ela seria seguida. Mas, quando as multas passaram a ser aplicadas de fato, o cenário mudou." 

A lei por si só não é suficiente para mudar automaticamente os maus hábitos associados à corrupção, mas ajudam a construir o cenário para essa transformação. A própria norma anticorrupção é fruto de avanços anteriores no terreno do direito brasileiro. A conselheira da agência internacional Ethic Intelligence, Ana Paula Martinez, lembra que para chegar à Lei Anticorrupção, o Brasil precisou trilhar outros caminhos como os que geraram a lei da Improbidade Administrativa, a lei do Tribunal de Contas da União (TCU) e o próprio Código Penal. Para ela, o pacote legislativo e a aplicação mais severa da lei têm deixado as empresas mais alertas e vem levando-as a buscar maior transparência de seus processos internos. 

Contratar consultoria, realizar investimentos em treinamentos e admitir pessoas especializadas em compliance pode ser caro, especialmente para empresas de menor porte, mas é um sacrifício considerado necessário. Sócio líder de finanças corporativas da Deloitte no Brasil, José Paulo Rocha diz que as empresas que não adotarem boas práticas de governança e programas anticorrupção podem se dar muito mal. Segundo ele, companhias de capital fechado e familiares têm se mostrado as mais preocupadas em mitigar riscos internos. 

"Dizer que a Lei 1.2.846 é importante é uma expressão pequena. Ela é fundamental e segue um movimento internacional de reforço da cultura anticorrupção. Ela vai pegar", diz Marta Viegas, membro do conselho de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Em sua opinião, as exigências da lei devem ganhar adesão de um universo maior de empresas por vias indiretas. "Muitas das pequenas e médias empresas são fornecedoras das grandes. As grandes vão exigir que elas se adaptem para continuar a parceria nos negócios e é por esse caminho que serão levadas a reforçar seus controles anticorrupção." 

Outro efeito que a lei deverá trazer com o tempo, segundo Marta, é a confiabilidade das estruturas de compliance das empresas. Ao ser aplicada, a lei vai mostrar se as empresas têm de fato uma cultura anticorrupção ou se o discurso está apenas no papel. No fim, o que se espera é que todas essas ações coloquem o país numa posição melhor no combate à corrupção. 

Segundo a Transparência Internacional, no ano passado, o país ocupava a 69. posição entre os 175 países avaliados, com 43 pontos de 1.00. Pesquisas anteriores da organização mostravam que 70% das empresas gastam até 3% do faturamento para pagamento de propinas. Das empresas que participam de licitações, 62% relatam terem sido sujeitas a pedidos de propinas.