15/12/2017 às 00h00 com informações de DCI

Juristas combaterão mudanças na Lei de Recuperação Judicial pela Fazenda

Responsáveis pela elaboração do pré-projeto de reforma na legislação se irritaram com pontos incluídos pelo fisco

As alterações feitas pelo Ministério da Fazenda no projeto de reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falência irritaram os juristas que trabalharam em grupos de estudos para promover a atualização das regras. Vários deles devem pressionar congressistas a não aprovar o texto.

O promotor de Justiça da Área de Falência, Arthur Migliani, disse nesta quinta-feira (14) em evento da Confiança Administração Judicial (Conajud), em Barueri (SP), que a pior alteração que a Fazenda fez no pré-projeto elaborado por técnicos da área jurídica foi incluir o fisco na recuperação judicial. “Não é possível recuperar uma empresa se a Fazenda estiver na assembleia de credores, porque a Receita tem um crédito privilegiado. O valor devido ao Fisco está inscrito no Código Tributário Nacional, que é uma lei complementar e, portanto, está acima de todas as outras legislações com a exceção da Constituição”, diz.

Para ele, essa alteração será danosa a todos os setores empresariais do Brasil. “Colocar a Fazenda dentro de um processo de recuperação judicial é aniquilar a economia nacional”, opina. O procurador diz que fará pressão para que o Congresso não aprove a nova lei como está e que a população deve cobrar o posicionamento dos deputados.

Já o juiz da 1ª Vara de Falência e Recuperação Judicial do Tribunal de Justiça de São Paulo, Daniel Cárnio, que participou da elaboração do pré-projeto de reforma da lei, avalia que os juízes especializados devem resistir a alguns pontos da proposta da Fazenda como fizeram com a lei antiga, que tinha artigos muito duros, como o que tornava improrrogável o prazo de seis meses para acordo com credores. “A jurisprudência vai cumprir o seu papel de ajustar essas distorções que não são compatíveis com a lei.”

Histórico do caso

Daniel Cárnio lembra que em 2016 apresentou-se a necessidade de alteração da Lei 11.101/2005, que rege as recuperações judiciais, porque se verificou que os resultados obtidos com aquela legislação não foram satisfatórios para resolver a crise das empresas.

Com isso, foram criados grupos de estudos compostos por especialistas na área para discutir alterações que gerassem ganhos em eficiência na lei, excluindo-se os pontos negativos. No fim de julho, esses grupos entregaram um pré-projeto ao Ministério da Fazenda, que após quatro meses enviou uma proposta para o Ministério da Casa Civil.

Essa proposta, como foi antecipado na imprensa, mudou uma série de tópicos do pré-projeto, colocando diversos aspectos polêmicos que não existiam antes como a possibilidade da Fazenda decretar falência da empresa em caso de não pagamento de dívidas tributárias. Também passou a ser previsto que a Receita terá voto na assembleia de credores, podendo impedir que a companhia venda ativos.

Outro ponto polêmico incluído pela Fazenda foi a possibilidade dos bancos trocarem a gestão e assumirem o comando das empresas em recuperação judicial. Além disso, pela nova proposta, se o devedor não conseguir aprovar seu plano na assembleia, credores que representem um terço da dívida terão o direito de apresentar seu próprio plano.

Cárnio ressalta que as alterações que os especialistas previam antes na lei de recuperação judicial eram a inclusão de dívidas inscritas no regime de alienação fiduciária no plano, a criação de varas especializadas em diversas regiões do Brasil e a concessão de um parcelamento tributário mais benéfico.

Desses, apenas a criação de varas especializadas foi totalmente mantido, comenta o magistrado. “As alienações fiduciárias saíram, porque o governo disse que não era o momento de mandar uma mensagem errada ao mercado de que o crédito bancário seria desprotegido”, destaca.

Já com relação ao parcelamento, houve flexibilização no número de parcelas, que sai de 84 para 120 meses, mas surge a previsão que não havia antes do fisco decretar falência da empresa em caso de não pagamento e, mesmo o aumento do número de parcelas, para Cárnio, não foi benéfico o bastante. “É uma condição pior do que a de qualquer Refis, oferecido a companhias sem crise.”